ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA JURÉIA X CIDADE DE IGUAPE
Arnaldo das Neves
ESTAÇÃO ECOLÓGICA DA JUREIA
No início dos anos 60 instalou-se em Iguape a empresa “Palmito Caiçara”, a primeira fábrica de industrialização de palmito em conserva do Brasil, utilizando o palmiteiro juçara (euterpe edulis). Na década de 70, Iguape torna-se o maior exportador brasileiro de palmito. Por sua vez, o Brasil foi o maior exportador mundial de palmito em conserva.
Ainda no final dos anos 70, a empresa Gomes de Almeida Fernandes apresentou um projeto de construção de um condomínio de alto padrão na Região da Praia do Rio Verde, houve reação da sociedade iguapense e ambientalistas paulistanos, o que resultou num acordo de doação, pelo empreendedor, de uma área de 5.000 hectares para preservação no maciço da Juréia.
Durante os anos 80, a área da Juréia foi escolhida pela NUCLEBRÁS para implantar duas usinas nucleares, pois a coexistência de estações ecológicas e usinas nucleares representava, simultaneamente, proteção de áreas naturais para o entorno das usinas. Neste contexto, criou-se a Estação Ecológica da Juréia (1980), com 23.600 hectares, ficando proibido o acesso de qualquer cidadão que não fosse pesquisador ou cientista.
Em 1986, O Decreto Estadual Nº 26715, 226716, 26717, 26718, de 06/02/86, amplia a área da Estação Ecológica da Juréia e a declara de utilidade pública. Em 1987 com a promulgação da Lei Estadual nº 5659-87, a área da Estação Ecológica da Juréia Itatins fica sob a responsabilidade do Estado de São Paulo.
Iguape é uma cidade que remonta à época da Colônia e desde então vive da exploração dos recursos naturais. Na década de 1980, tínhamos cerca de 7 fábricas de palmito na cidade, 8 fábricas de caixeta, e outras tantas de secagem de manjuba. Só a industrialização da caixeta era responsável por 450 empregos diretos (Maldonado, 1985). Por incrível que pareça, na mesma época, (1986), na Amazônia, Chico Mendes criava as primeiras Reservas Extrativistas (RESEX).
Nasce o conceito de uso sustentável das florestas nativas, ou melhor, se formaliza o jeito brasileiro de preservar a natureza. A Jureia é um marco do movimento ambientalista paulista. O Governo Franco Montoro responsável pela ampliação da Estação Ecológica da Juréia, de 23.000 ha, para 79.000 ha., foi o primeiro governo eleito após a queda da ditadura. As práticas para a fiscalização ambiental foram herdadas do período ditatorial. Na ampliação da Estação Ecológica da Juréia, foram incluídas cerca de 350 famílias e 14 comunidades dentro de seus limites, causando um ônus social que perdura até hoje.
A partir da criação da Estação Ecológica da Juréia, o Estado criminalizou a atividade de uso dos recursos naturais, fechou todas as fábricas de Palmito e de beneficiamento de caixeta no município de Iguape. Como compensação, prometeu trazer um desenvolvimento melhor para o município, o desenvolvimento sustentável. O Estado não cumpriu a promessa e hoje sobramos nós com a miséria e a clandestinidade.
Vemos o mundo todo elogiar a Amazônia, com os programas de desenvolvimento sustentável de uso da floresta nativa e inclusão das comunidades, que ocorrem, desde 1986. Nós, iguapenses, pioneiros precursores deste tipo de economia sustentável, tivemos as atividades de uso sustentável da floresta nativa criminalizadas!
E por conta de uma política pública que não considerou o humano como parte desse ecossistema, com uma visão estritamente urbana e autoritária, e não discutida com todos os setores de nossa sociedade, estamos em um acelerado processo de decadência econômica, que obriga nossos jovens a procurar destino em outras cidades. Vinte e cinco anos depois da aplicação desta política pública, praticamente se extinguiu o palmiteiro juçara de nossas matas, nossa maior riqueza florestal. Perde a sociedade, perde o meio ambiente.
Após vinte anos de luta, em 2006, por iniciativa da União dos Moradores da Juréia (UMJ), entidade fundada em 1990 e que congrega as comunidades da Juréia de Iguape e o Mosaico de Unidades de Conservação da Juréia, foram as primeiras Reservas de Desenvolvimento Sustentável (RDS) da Mata Atlântica do Brasil. Esta lei vigorou de 2006 a 2009, quando uma ação de inconstitucionalidade (ADIN), iniciada por Fabio Feldmann, representando a SOS Mata Atlântica, anulou a Lei e toda a área voltou a ser Estação Ecológica.
A UMJ sempre buscou reclassificar a EEJI incluindo todas as comunidades em RDSs. Após a ADIN o Governo de SP encaminha, em novembro de 2011, ao CONSEMA outro projeto de lei que reclassifica em RDS só duas comunidades da Juréia a do Despraiado em Iguape e da Barra do Una em Peruíbe. A UMJ protocolou, na mesma data, no CONSEMA, uma proposta divergente, que contempla a inclusão de todas as comunidades da Juréia em Reservas de Desenvolvimento Sustentável.
Neste tipo de reserva florestal pode ser feito o uso sustentável dos recursos naturais de forma legal, como fazia Iguape nos idos de 70-80. Os próximos passos para a reclassificação da Juréia é o encaminhamento da proposta ao Governador, e, depois, à Assembleia Legislativa de SP.
Na Assembleia se dará o embate entre Governo e Sociedade, quando pretendemos, junto com a população iguapense, recolocar o município no topo da discussão do desenvolvimento sustentável, local de onde nunca deveríamos ter saído. É o momento para que a sociedade iguapense se manifeste.
QUEREMOS TER ACESSO AO RIO VERDE? Quem conhece o Rio Verde?
Queremos voltar a ser um município que, nos moldes da Amazônia, se caracterize como um município sustentável, que maneja os recursos florestais nativos e valoriza os agricultores? Queremos voltar a ser um município que cuida de seus moradores, se preocupa com a inclusão social e manutenção da população rural em seus territórios? Dê sua opinião participe!
Lendo a matéria do Arnaldo das Neves sobre a Estação Ecológica da Juréia, rememorei por aqui os tempos de militância à frente da Assoc. em Defesa da Juréia nos anos 80/90, onde fui conselheiro e participante ativo das discussões que levaram - na época - á criação da Estação Ecológica Juréia-Itatins. Nesse debate acalorado, muitas vezes o discurso anti-ambientalista partia das autoridades locais, que acreditavam numa Iguape ladeada por indústrias e por um padrão de desenvolvimento que não convinha para a região. Fui um crítico voraz, dentro da Assoc. em Defesa da Juréia, da visão purista da estação ecológica não comtemplar moradores (mesmo porque muitos dos meus familiares nasceram e/ou viveram na região) e foram eles os responsáveis pela preservação (ou não?!) O decreto da estação ecológicaa numa gigantesa área no governo Montoro pegou a todos nós de "surpresa", porque sabíamos que a pressão seria muito forte, e os custos de desapropriação certamente impossíveis.
ResponderExcluirPOr outro lado, lembro que muitas das nossas reuniões giravam em torno dos interesses de alguns poucos e pequenos empresários locais - que se utilizavam da boa fé dos moradores e das populações tradicionais para reforçarem seus interesses em continuar produzindo dentro da área da estação (e isso soava para nós como uma das coisas preocupantes que deveríamos combater!) Estou afastado atualmente das discussões sobre a Juréia, e gostaria de aprofundar a reflexão sobre os pontos da ação impetrados pelo meu amigo Fábio Feldmann (aliás, um dos grandes ambientalistas do Brasil e do mundo). Mosaicos ou outras categorias de unidades de preservação ambiental não podem levar a um esfacelamento do arcabouço jurídio que norteou a criação da estação ecológica, levando a um "loteamento" e a um sucateamento imobiliário da região, processo esse tão presente em grande parcela do nosso litoral? Como conciliar essas duas vertentes, estimulando a pesquisa e o conhecimento científico, aliado ao ecoturismo sem destruir o patrimõnio ambiental? Qual a posição das autoridades e dos 'ecologistas" iguapenses sobre a questão!
Antonio M. Veiga (amveiga@uol.com.br)