A franqueza não ajuda ninguém a vencer na vida. Melhor é
ficar quieto, “se mancar”, “deixar correr o barco”. Enfim, esperar que a
verdade apareça por acaso, que a maioria a apoie e, então, entrar na passeata
do protesto. Essa é a estratégia do “brasileiro médio”, conceito que se entende
tanto melhor quanto menos se explica. Quem, num momento qualquer, por falta de
assunto ou por não aguentar ficar calado, resolve falar, pode ficar “marcado”,
por boquirroto (passando a ser evitado pelos “prudentes”) ou, na melhor das hipóteses,
se a tese receber apoio geral, começar a representar o papel de herói aquele
que se põe (por conta própria ou alheia) à frente das causas e um dia sai
vencedor ou se estrepa.
Olho uma foto da reunião para discutir o “caso” da
cobrança de pedágio, entre Iguape e a Ilha Comprida. Não é possível deixar de
fazer uma ligação entre essa reunião e os acontecimentos no Espírito Santo,
quando uma revolta popular tenta pôr fim à roubalheira do pedágio entre duas
cidades. O paralelo entre aquele pedágio-roubo de Vitória e o pedágio-roubo de Iguape-Ilha
Comprida é visível. Por que a reunião? Será que os dirigentes das duas cidades
estão inquietos e pensam em acabar com essa cobrança sem sentido, antes que o
povo se revolte e ponha fogo nas cabines?
Na foto-capa do jornal, um sujeito, ao lado do prefeito
da Ilha, fala, o prefeito da Ilha ouve em silêncio. O conteúdo do discurso do
orador do momento, que transparece na sua expressão, é ambíguo: ele está
justificando alguma coisa, talvez a permanência do pedágio (veremos as
justificativas mais comuns mais à frente), ou sua extinção. Neste último caso,
não é por gosto, naturalmente, mas por medo da repetição do quebra-quebra do
Espírito Santo. Enquanto ele fala, o prefeito de Iguape troca figurinhas com
seu vizinho de mesa, um vereador iguapense.
Isso é o que podemos ver na foto do frontispício do
jornal. No texto da notícia, páginas depois, uma foto mais abrangente capta
outras dimensões e personagens da reunião. Um rapaz gordo, de jeans, está
inclinado na direção do prefeito de Iguape, mas parece conversar com o vereador
a seu lado. Outras pessoas são vistas, naquela pose de espera, quando se ouve e
se cogita, mas não se tenta entrar na conversa. É questão de aguardar. Mas quem
é aquele moço atrás de todos, solitário e aparentemente desinteressado na
conversa? Sim, é ele, o mais brilhante vereador das duas cidades, o homem que não
conseguiu ser prefeito de Iguape, em duas tentativas, mas foi o vereador mais
bem votado nas últimas eleições.
Como a “Ana
Maria” da bela musiquinha de Juca Chaves, o vereador está pensativo. O que sonha
“Ana Maria?” digo, o vereador? “É uma vergonha, mas que posso fazer?” “Extinto
o pedágio, perdem-se empregos: está certo?” “Faltam fontes de renda, na cidade,
como acabar com alguma coisa que traz dinheiro de fora?” “Mas, afinal, são
apenas alguns trocados, quem vem à praia tem dinheiro, não vai lhe fazer falta!”
“Vamos ver o que os dois prefeitos resolvem; conforme o caso, sou contra, ou a
favor!” “Razão, seu nome é mistério; Justiça, seu nome é circunstância!”
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