SEGUNDA-FEIRA – Zé Farofeiro
contou pra Joãzinho Pé-de-boi que Tateto andava rodeando a mulher de Chico
Cheira-cheira. Joãozinho Pé-de-boi misturou Chico Cheira-cheira com Chico
Pindaíba, mudou a direção do boato e
disse a Laurentina Boca Larga, sua mulher, que Pindaíba estava namorando
Lurdinha, filha de Cheira-cheira. Laurentina Boca Larga, que não negava o
apelido, passou de imediato a Irene da Vila que Chico Cheira-cheira tinha
brigado com Pindaíba porque este estava dando em cima de sua filha, Lurdinha,
também conhecida como Lurdinha Busca-pé. O caso deu uma revoada na praça de
Brejaúva e, quando voltou para os ouvidos de Farofeiro, depois de um estágio no
bar de Furrié, pelas bocas de Zé Caturrinha e Dito Parati, e um repique no
salão de sinuca de Sebastião Titica, por conta de Tamborim e Serafim Tisão,
Lurdinha Busca-pé já estava fazendo as malas para ir à Capital, onde faria o
aborto de um filho, responsabilidade não mais de Pindaíba, mas de Galo-cego.
TERÇA-FEIRA – Lurdinha
Busca-pé soube da “viagem” na quitanda de Sakai e foi interpelar Sebastião
Titica sobre o pai da calúnia. Sebastião Titica, pra não prejudicar Tamborim e
Serafim Tisão, os “comentaristas”, do caso, botou a culpa em Zé Chachangue, que
o dedurou ao promotor por vender cigarros a menores. Nessas alturas, Galo-cego
tinha sumido da praça, mas Chachangue foi abordado por Lurdinha no mercado,
conversando com Minguinho Coruja. Este,
quando pressentiu o rapapé, saltou fora e ficou espiando de longe o aperto do
amigo. Chachangue saiu do mercado com espuma na boca e foi direto ao bar de
Sebastião Titica. No final do dia, Brejaúva foi informada do resultado da
encrenca: um galo na cabeça de Chachangue, por conta de uma bola de bilhar, e a
orelha amassada de Sebastião Titica, produto de um certeiro golpe de taco.
QUARTA-FEIRA – Cheira-cheira
tomou conhecimento das estripulias da filha e começou os “entendimentos” com
ela no tapa e no berro, pela vergonha de sujar o nome da família. Lurdinha
Busca-pé, o rosto vermelho e a boca espumando, replicou que quem suja o nome da
família é o pai fraco que deixa falarem mal da filha. Cheira-cheira avançou
para a revanche, mas foi contido por um golpe de frigideira no cangote, por
conta de sua mulher, Zulmira Pé de Pato. O ribombo da briga foi ouvido pelos vizinhos
Enxadão e sua mulher, Laurentina Trovão, que se aprontaram para passar a
novidade adiante, logo que Cheira-cheira se escafedeu para a rua, a fim de
refrescar o miolo.
QUINTA-FEIRA – Por conta da
confusão de nomes, apelidos e ocorrências, a encrenca pegou feio prá todo lado,
juntando mais gente no boato. O falatório correu pelas ruas, becos e
bares, misturou pessoas e fatos,
implicou de santinhas a suspeitosas, de homens de respeito a sujeitos
ordinários. A certa altura, já não se sabia direito quem fizera o que com quem
ou tinha falado o que, de quem, então a sujeira pululou. Deu briga no bar de
sinuca de Sebastião Titica, rapapés no mercado, ameaças de morte na feira.
Mulheres discutiam na rua, velhinhas se benziam nas esquinas, crianças corriam de
todo lado. O forrobodó só deu uma parada entre o almoço e o café da tarde.
Depois da soneca, estourou um pega-prá-capar, no meio da rua, e uma briga feia
no bar de Sebastião Titica. O sangue fervia, os boatos se espalhavam do mercado
à praça, dos bares às padarias.
Pipocaram queixas na delegacia e houve intervenções policiais.
SEXTA-FEIRA - Manhã - o
delegado mandou o guarda Zé Xereta intimar todos os envolvidos nas pendengas e
ele saiu, lépido. O guarda Roleibol (também conhecido como Chico Preto) confidenciou
ao delegado que Zé Xereta era partidário do Prefeito e, por isso, só convocaria
para depor seus inimigos. O delegado branqueou, vermelhou, roxeou e voltou a
branquear. Então encarregou Roleibol de chamar a outra metade do
"litígio". Roleibol arregalou os olhos, aturdido, e o delegado
gritou: "Vai logo, seu burro!" Então ele entendeu e sumiu.
SEXTA-FEIRA – Tarde – Vinte
pessoas se espremiam e se desentendiam aos gritos, na sala da Delegacia. De
repente o delegado, que já tinha branqueado, vermelhado, roxeado e voltado a
branquear, duas vezes, berrou: CALEM A BOCA, TODOS!!! Zé Xereta e Roleibol se
perfilaram e bateram continência, e os dois presos na Delegacia saltaram do
catre. Por dez segundos só se ouviu o zumbido de uma motuca voejando sobre as
cabeças.
Enfim, começaram os depoimentos. Zé
Bolão, o escrivão, acomodou seus cem quilos na cadeira e pôs-se atento. O
delegado resolveu ir "por partes", ouvindo e repetindo ao escrivão, o
que diziam os "querelantes". Cada vez que usava essa palavra, o delegado,
bacharel de fim-de-semana, mas com curso de Lingua Portuguesa por
correspondência, avisava Zé Bolão: "Com qu!", e Zé Bolão lascava um
"qu" em cima do “k” que já tinha escrito.
Às seis da tarde, Zé Xereta,
exausto, encostava-se na porta, Roleibol sentado numa cadeira balançava a
cabeça, tonto, os dois presos roncavam de barriga prá cima, e o delegado, que
já tinha tirado o paletó e afrouxado a gravata, entregou os pontos: mandou todo
mundo embora. Zé Bolão juntou a papelada e jogou tudo num cesto, nos fundos da
Delegacia.
SÁBADO – Os Evangélicos e
Pentecostais foram em silêncio para suas Igrejas, ouviram sermões azedos de
seus Ministros e Pastores, se arrependeram e leram os quatro Evangelhos, de
ponta a ponta.
DOMINGO – Os Católicos
foram em silêncio para a sua Igreja, ouviram em silêncio o sermão azedo do
Padre, se arrependeram e passaram duas horas rezando o terço.
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