terça-feira, 17 de junho de 2014

Uma velha crônica



 

              POLÍTICA: AS FORÇAS OCULTAS

 

        Sempre tivemos, mesmo antes do surto do “mensalão”, a reiterada eleição de políticos desonestos, a convivência (ou conivência?) pacífica do povo brasileiro, principalmente dos pobres, com a presença constante, entre nossos dirigentes, de pessoas e grupos, melhor dizendo, quadrilhas, que infestam nossas instituições. Falo instituições, porque o problema é geral, não é só no Congresso ou nas Câmaras, ou nos postos executivos, mas está também nas alfândegas, nas delegacias e, até, na magistratura.

        Os estrangeiros, as pessoas sensatas, os intelectuais honestos, daqui e de alhures, excogitam teorias as mais diversas, na tentativa de entender o que se passa neste país, no campo do exercício da democracia. Observando o “circo” montado pelos políticos, em todas as eleições, ou conversando com as pessoas conhecidas, temos dificuldade, ainda assim, de atinar com a resposta a essa dúvida. Mesmo aqueles sábios voltados ao estudo das ciências sociais não conseguem dar uma resposta unívoca ao problema crucial, com que se martirizam as pessoas honestas e de boa vontade: afinal, porque tantos políticos nossos não criam jeito? 

        Da minha parte, modestamente, acredito que esse mistério não encontra sua resposta na observação do comportamento dos candidatos, porque, muitas vezes, eles são uma coisa antes e outra coisa, depois das eleições. Por sua vez, os órgãos da imprensa, bem como pessoas de certo relevo social, têm opiniões e pontos de vista, nem sempre despidos de ideologias, portanto contaminados por preconceitos. As pessoas do povo, de modo geral, por receio, timidez ou hipocrisia, disfarçam seu pensamento e fabricam respostas que mostrem não o que elas pensam, mas o que desejam que os outros achem que elas pensam.

        Sem querer desqualificar outras explicações, achamos que uma das respostas para esse mistério está na cabine de votação. Ali é que parecem surgir as “forças ocultas”, que buscamos em vão, no espaço público. Aquele recinto exíguo, que só se diferencia do confessionário porque as revelações são feitas a uma máquina e não a uma pessoa, é o lugar ideal para que os segredos sejam expostos em sigilo, portanto livres de castigo, e onde a rara virtude se mostra tímida, diante da fraqueza humana. Protegido da sanção social, o eleitor exprime seus desejos com a liberdade de um beduíno solitário, no seu oásis. Nessa situação de isolamento, os baixos instintos têm a oportunidade de aflorar à consciência, de tomar o leme das decisões, de fazer falar aquilo que a censura pública reprime.

        Naquele momento decisivo para o exercício da cidadania, em vez de funcionar a consciência social, entra em ação o “homem lobo do homem”, aquele que põe seus interesses pessoais acima dos interesses coletivos. Então, o seu voto vai na direção daqueles políticos que podem resolver os “seus” problemas, e não os problemas da coletividade, o que vai “quebrar o seu galho”, e não dedicar-se à causa pública. Ainda quando isso não ocorre, a escolha também pode ser feita pela ótica da simpatia, da amizade, da subserviência e outros “pecados”, não menos graves do cidadão.

        Enfim, a “vitória democrática” do voto secreto, se mostra uma “vitória de Pirro”, em vista do egoísmo, da falta de cidadania, da debilidade da educação, da falta de esclarecimento, dos eleitores. Com tudo isso, entretanto, com toda essa conclusão perversa, mas lógica, que se torna concreta diante da realidade vivida, não adianta pensar numa volta ao passado, ao “voto do cabresto”, ou ao “voto dos melhores”, isto é, da aristocracia do dinheiro ou do sangue. O que se deduz, enfim, é que a democracia é incompatível com a ignorância, que a liberdade de escolha dos dirigentes políticos é incompatível com a falta de cidadania, esta, por sua vez, sendo consequência de uma educação (no seu sentido mais amplo) falha, que leva ao egocentrismo, à desonestidade, à luta pelos próprios interesses, em prejuízo do interesse coletivo.

        A conclusão final é que a culpa pela má administração e pela reiterada falcatrua dos bens públicos deve recair, antes para o eleitor e, só depois, para o político, pois se este “não presta”, não vai conseguir fazer mais do que sua natureza manda. Assim, as falhas de caráter de uma boa parte dos políticos, muitas vezes trazida à discussão, não é o ponto principal do problema. O ponto principal é a falha de caráter do eleitor, que aflora naquele momento de solidão, dentro da cabine inviolável. Essa solidão diminui os liames do cidadão mal educado com a ética pública, dando oportunidade aos seus impulsos egoísticos.

 

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