Desde a Idade Média até mais ou menos
o século XVII, os europeus dividiam a Humanidade em dois tipos de pessoas:
cristãos e infiéis; por sua vez, os árabes e outros povos do Oriente próximo,
mudavam as denominações para muçulmanos e infiéis. Para os europeus, quem não
fosse cristão, a não ser em raríssimas exceções, ia para o inferno. Numa forma
inversa, isso funcionava também entre os muçulmanos. Desse modo, pela lógica, que
nunca habitou o mundo da religião, toda a Humanidade, por estar deste ou
daquele lado, estava condenada a padecer eternamente nas Caldeiras do Botelho.
Na atualidade, os teorizadores
ideológicos deixaram em segundo plano as categorias religiosas e dividiram a
humanidade segundo a terminologia dos membros humanos: esquerda e direita.
Nesse processo, a posição “direita”, antes santificada na Teologia, foi satanizada
e, por vias das consequências, evitada, desde que os nazistas e fascistas foram
derrotados nos anos quarenta do século XX. Então, para evitar mal-entendidos, o
pessoal da direita passou a se autodenominar “de centro”. Por sua vez, a turma
da esquerda, santificada por um passado de lutas contra o nazismo, o fascismo,
os governos militares e os ditadores de todos os matizes, apossou-se das honras
e privilégios teocráticos vigentes, na Idade Média, tanto entre os cristãos
como os muçulmanos, e passou a vilipendiar quem não luta nas suas trincheiras.
Aqui, no Vale do Ribeira, esse
colorido ideológico foi substituído por duas posições políticas simplificadas: “situação”
e “oposição”. Os adeptos da situação cacarejam alegremente sua opção em
qualquer lugar público, mas os da oposição cultivam a discreta atitude de só criticar
os atos e fatos políticos na intimidade de sua grei. Dessa maneira, a impressão
de um visitante eventual da cidade é de que quase todos os seus habitantes são
favoráveis às autoridades de plantão.
Outra característica da política das
pequenas cidades é a fluidez das fronteiras ideológicas (ao contrário da
fixidez pétrea das convicções religiosas do passado). O candidato pelo PSC (Partido
Social Cristão) numa eleição poder ser o candidato pelo Partido Comunista
Brasileiro, na outra; o “tucano” de hoje pode ser o petista de amanhã. Essa “infidelidade
partidária” é o resultado da luta pelas siglas, duelo que se desenvolve assim
que se aproximam as datas de eleição. Não conheço bem os procedimentos dessa “jornada
no escuro”, mas sei que, por trás delas, há o poder dos políticos de âmbito
estadual e federal, que precisam agradar lideranças locais, visando sua própria
eleição, no futuro.
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