terça-feira, 9 de abril de 2013

OS INCRÍVEIS E BELOS MODOS DE FALAR


       Seja pela sua extensão, seja pela variedade da imigração, seja pela imaginação de seus habitantes, o Brasil apresenta mil e uma maneiras de se expressar, embora o idioma nacional seja apenas um: aquele que veio das beiradas do Tejo, ou do Alentejo. Entretanto, uma vez aqui, o Idioma Português se fez miríades de modos de expressão, o que o enriqueceu e aumentou o prazer de ouvi-lo e pensá-lo.
         O Vale do Ribeira também tem seus vários modos de expressão linguística, os quais têm sido preservados, aqui e ali, pelos mais atentos e mais cuidadosos de seus habitantes. Há quem aprecie, há quem procure evitar, aquilo que, de certa maneira, faz parte de um passado que se espedaçou no calendário, e do qual, até, alguém mais pretensioso, tenha vergonha de repetir. Mas para quem aprecia a leitura (e as línguas e linguagens, concomitantemente) esses resquícios de expressão do passado se constituem em “iguarias” deliciosas.
          É com esse espírito de acrescentar prazer à leitura, que transcrevemos, abaixo o artigo “Dicas pra viver em Minas”, extraídas do livro “As coisas simpáticas da vida” (Landy Editora, São Paulo – SP – 2005, pg 82) do paradoxal paulistano (vejam só) Felipe Peixoto Braga (1973) que mora em Belo Horizonte e afirma não ter nunca publicado qualquer coisa. (Imaginem se “tivesse publicado...”) a nós enviado pela senhora Silvana Arkangeletti Takabatake:  

Quem nasceu nas Minas Gerais, entende muito bem tudo isto, mas quem não nasceu lá, precisa de conhecer e entender o "MINEIRÊS".
Bão dimais sô!!!

                                      DICAS PRA VIVER EM MINAS

O SOTAQUE DAS MINEIRAS

- O sotaque das mineiras deveria ser ilegal, imoral ou engordar. Afinal,se tudo que é bom tem um desses horríveis efeitos colaterais, como é que o falar, sensual e lindo das moças de Minas ficou de fora?
- Porque, Deus, que sotaque! Mineira devia nascer com tarja preta avisando: 'ouvi-la faz mal à saúde'. Se uma mineira, falando mansinho, me pedir para assinar um contrato doando tudo que tenho, sou capaz de perguntar: 'só isso?'. Assino, achando que ela me faz um favor.
- Eu sou suspeitíssimo. Confesso: esse sotaque me desarma. Certa vez quase propus casamento a uma menina que me ligou por engano, só pelo sotaque.
 - Os mineiros têm um ódio mortal das palavras completas... Preferem, sabe-se lá por que, abandoná-las no meio do caminho. Não dizem: pode parar, dizem: 'pó parar' Não dizem: onde eu estou?, dizem: 'onde queu tô.'
- Os não-mineiros, ignorantes nas coisas de Minas, supõem, precipitada e levianamente, que os mineiros vivem - lingüisticamente falando - apenas de uais, trens e sôs.
 - Digo-lhes que não. Mineiro não fala que o sujeito é competente em tal ou qual atividade. Fala que ele é bom de serviço. Pouco importa que seja um juiz, um jogador de futebol ou um ator de filme pornô. Se der no couro - metaforicamente falando, claro - ele é bom de serviço. Faz sentido...

- Mineiras não usam o famosíssimo tudo bem. Sempre que duas mineiras se encontram, uma delas há de perguntar pra outra: 'cê tá boa?' Para mim, isso é pleonasmo. Perguntar para uma mineira se ela tá boa é desnecessário. ...
 - Há outras. Vamos supor que você esteja tendo um caso com uma mulher casada.
 - Um amigo seu, se for mineiro, vai chegar e dizer: - Mexe com isso não, sô (leia-se: sai dessa, é fria, etc..) O verbo 'mexer', para os mineiros, tem os mais amplos significados. Quer dizer, por exemplo, trabalhar. Se lhe perguntarem com o que você mexe, não fique ofendido. Querem saber o seu ofício.
 - Os mineiros também não gostam do verbo conseguir. Aqui ninguém consegue nada. Você não dá conta. Sôcê (se você) acha que não vai chegar a tempo, você liga e diz: '- Aqui, não vou dar conta de chegar na hora, não, sô.'
 - Esse 'aqui' é outra delícia que só tem aqui. É antecedente obrigatório, sob pena de punição pública, de qualquer frase. É mais usada, no entanto, quando você quer falar e não estão lhe dando muita atenção: é uma forma de dizer 'olá, me escutem, por favor'. É a última instância antes de jogar um pão de queijo na cabeça do interlocutor.
 - Mineiras não dizem 'apaixonado por'. Dizem, sabe-se lá por que, 'apaixonado com'. Soa engraçado aos ouvidos forasteiros. Ouve-se a toda hora: 'Ah, eu apaixonei com ele...'. Ou: 'sou doida com ele' (ele, no caso, pode ser você, um carro, um cachorro).
 - Eu preciso avisar à língua portuguesa que gosto muito dela, mas prefiro, com todo respeito, a mineira. Nada pessoal. Aqui certas regras não entram. São barradas pelas montanhas.
 - Por exemplo: em Minas, se você quiser falar que precisa ir a um lugar, vai dizer: - 'Eu preciso de ir.'
- Onde os mineiros arrumaram esse 'de', aí no meio, é uma boa pergunta..
 Só não me perguntem!
- Mas que ele existe, existe. Asseguro que sim, com escritura lavrada em cartório.
 - No supermercado, o mineiro não faz muitas compras, ele compra um tanto de coisa. O supermercado não estará lotado, ele terá um tanto de gente. Se a fila do caixa não anda, é porque está agarrando lá na frente.
 Entendeu? Agarrar é agarrar, ora!
 - Se, saindo do supermercado, a mineirinha vir um mendigo e ficar com pena, suspirará :'- Ai, gente, que dó.'
 - É provável que a essa altura o leitor já esteja apaixonado pelas mineiras...
-  Não vem caçar confusão pro meu lado! Porque, devo dizer, mineiro não arruma briga, mineiro 'caça confusão'. Se você quiser dizer que tal sujeito é arruaceiro, é melhor falar, para se fazer entendido, que ele 'vive caçando confusão'.
 - Ah, e tem o 'Capaz....' Se você propõe algo a uma mineira, ela diz:
 'capaz' !!! Vocês já ouviram esse 'capaz'?
 - É lindo. Quer dizer o quê? Sei lá, quer dizer 'ce acha que eu faço isso'!?
 com algumas toneladas de ironia.. Se você ameaçar casar com a Gisele Bundchen, ela dirá: 'ô dó dôcê'. Entendeu? Não? Deixa para lá.
 - É parecido com o 'nem..'.Já ouviu o 'nem...'?
 Completo ele fica: '- Ah, nem....' O que significa? Significa, amigo leitor, que a mineira que o pronunciou não fará o que você propôs de jeito nenhum. Mas de jeito nenhum. Você diz: 'Meu amor, cê anima de comer um tropeiro no Mineirão?'.
 Resposta: 'nem....' Ainda não entendeu? Uai, nem é nem. Leitor, você é meio burrinho ou é impressão?
- Preciso confessar algo: minha inclinação é para perdoar, com louvor, os deslizes vocabulares das mineiras. Aliás, deslizes nada. Só porque aqui a língua é outra, não quer dizer que a oficial esteja com a razão.
 - Se você, em conversa, falar: 'Ah, fui lá comprar umas coisas...'.. -
 Que' s coisa? - ela retrucará. O plural dá um pulo. Sai das coisas e vai para o 'que'!

- Ouvi de uma menina culta um 'pelas metade', no lugar de 'pela metade'. E se você acusar injustamente uma mineira, ela, chorosa, confidenciará :
 - Ele pôs a culpa 'ni mim'.
- A conjugação dos verbos tem lá seus mistérios, em Minas... Ontem, uma senhora docemente me consolou: 'preocupa não, bobo!'.. E meus ouvidos, já acostumados às ingênuas conjugações mineiras. nem se espantam. Talvez se espantassem se ouvissem um: 'não se preocupe', ou algo assim. Fórmula mineira é sintética. e diz tudo.
- Até o tchau, em Minas, é personalizado. Ninguém diz tchau, pura e simplesmente. Aqui se diz: 'tchau pro cê', 'tchau pro cês'.
- É útil deixar claro o destinatário do tchau...

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