terça-feira, 30 de abril de 2013

RESERVA DO PARAÍSO - LEMBRANÇAS




              Na passagem dos anos 30 para 40, a Rússia já estava experimentando uma nova Constituição, que iria consolidar o regime comunista, sob Stalin, depois de um morticínio e uma sangrenta perseguição aos dissidentes. Na Alemanha, Hitler, já senhor da Alemanha, invadia a França, depois de haver invadido a Polônia, enquanto outros ditadores tomavam conta da Europa ocidental, com Mussolini na Itália, Franco na Espanha e Salazar em Portugal. No Brasil, Getúlio Vargas fingia que era o pai dos pobres, enquanto ajudava os ricos a ganharem dinheiro. Enfim, para não ficar atrás, o Oceano Pacífico começava a ferver, com a expansão sangrenta do Império Japonês.
              Enquanto isso, o Vale do Ribeira, depois de fazer os descendentes de japoneses saírem do litoral, para evitar uma hipotética comunicação deles com os submarinos alemães, permanecia tranquilo. Em Iguape, o Clube 25 de Janeiro reunia a elite da cidade, o Clube Liberdade fazia bailes com a classe média e o Primavera, embora teoricamente estivesse reservado ao proletariado, misturava todos os segmentos sociais, considerando, ainda, que entre seus fundadores, havia famílias de boa projeção social, na cidade. Em todos os clubes havia brigas, com variação de formato: no Clube 25 de Janeiro, preponderava o bate-boca; no Liberdade, sopapos organizados, nos fundos do prédio; no Primavera, xingações, pegas, porradas e sobe-desce na escadaria, com, pelo menos um caso, de salto pela janela – o clube ficava num sobrado. 
              Os bailes só ocorriam nos fins de semana. Nos dias de semana, a pequena e a grande burguesia passeavam ao redor do jardim da cidade, no Largo da Matriz, que nunca mais, nos anos posteriores, esteve tão bem arranjado. Seu Gamba, o guardião das flores, manejava um galho de árvore, sem folhas, com o qual castigava os moleques que pisavam nos canteiros. As moças e moços se cruzavam no passeio, com longos olhares e secretos sorrisos. Os pais de família jogavam bilhar ou conversavam em alguns bares, as mães colocavam cadeiras na porta de casa e reuniam grupos de prosa, que se esticava até as vinte e duas da noite, hora de recolher para todos, do jardim, dos bares e das calçadas, porque a luz apagava às onze da noite.   
               Nos fins de semana, a partir de certa época, começou a haver sessões de cinema. Parece que, em tempos idos, já existiam cinemas, em Iguape, que fecharam, por alguma razão. Também havia teatro, com peças nas quais trabalhavam pessoas do mesmo clã, porque dramas ou comédias, as peças, geralmente de teor sentimental, sempre continham alguma cena de leves carícias, e isso criava constrangimento para os artistas amadores, e suas famílias. Às vezes, em vez de peças, havia declamação de poesias. Ficaram na memória alguns trechos poéticos: “Coitadinha da galinha, vai morrer, hoje, talvez!” e “Num galho seco vi pousar um passarinho / E aos seus filhinhos ouvi cantar uma canção/”.. ... e por aí vai.
            Enfim, o mundo se estraçalhava, lá fora, mas cá, vivíamos num pedaço do Paraíso!               

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