O BOM HUMOR FRATERNAL
Para aliviar a “dureza” da
vida, em Iguape, temos o vento leste, a cerveja e o bom humor. O vento leste é
dom da natureza, a cerveja, embora tenha sua origem no Egito, foi presente dos
europeus, mas o tipo especial de bom humor que por aqui viceja, é autóctone.
Com relação a isso, nossos conterrâneos seguem à risca o conselho de Oscar
Wilde: “A melhor maneira de começar uma amizade é com uma boa gargalhada”. Mas
é o mesmo escritor que adverte: “Uma gargalhada também é a melhor maneira de
terminar uma amizade”. Afinal, nem tudo é perfeito. Além disso, há quem prefira
sacrificar até a amizade para não perder uma boa piada. Mas, insistimos, o
humorismo que por aqui viceja é particular e intransferível. Não tem validade
universal, não é composto de temas genéricos, que funcionam em qualquer lugar.
Ele se sustenta dos elementos da sua própria cultura, ou então reelabora as
contribuições alienígenas, acrescentando o tempero local, consistente de gestos
ladinos, malabarismos vocais e sintaxe ardilosa. Esse traço particularista
torna o humor iguapense uma espécie de código familiar uma linguagem de irmãos,
daí o adjetivo fraternal, com que o qualifico.
Mesmo com sua
originalidade, é possível entrever o parentesco desse humor com aquele de
alguns antigos “mestres do ofício”. Ele lembra um pouco o tom sarcástico de
Bocage, o “língua de trapo” dos poetas portugueses, entre outras coisas pelo
gostinho de fazer reparos pouco lisonjeiros sobre a aparência das pessoas. Como
aquele caso ocorrido num dia de Carnaval. Um grupo de pessoas estava apreciando
o desfile dos blocos, em torno da Praça da Basílica, quando passou um sujeito
baixinho, com pernas muito curtas. (Alguém havia comentado, pouco antes que, de
tanto dançar e pular, muita gente ia “gastar as pernas”) No meio do grupo, uma
voz exclamou: “Eh! Aquele dançou ‘pouco’!” Sacada típica de
Bocage, um campeão da sátira, que turbinava suas observações, por meio de epigramas. Foi assim que o mais galhofeiro dos poetas portugueses, referindo-se ao escritor Nicolau Tolentino, que tinha pés enormes, escreveu: “Se o Padre Santo tivesse/ Uns pés dos teus, Nicolau/ Podia mesmo de Roma/ Dar beija-pé em Macau”. E sobre o nariz um tanto exagerado de uma senhora: Nariz, nariz e nariz/ Nariz que nunca se acaba/ Nariz que se ele desaba/ Fará o mundo infeliz”.
Bocage, um campeão da sátira, que turbinava suas observações, por meio de epigramas. Foi assim que o mais galhofeiro dos poetas portugueses, referindo-se ao escritor Nicolau Tolentino, que tinha pés enormes, escreveu: “Se o Padre Santo tivesse/ Uns pés dos teus, Nicolau/ Podia mesmo de Roma/ Dar beija-pé em Macau”. E sobre o nariz um tanto exagerado de uma senhora: Nariz, nariz e nariz/ Nariz que nunca se acaba/ Nariz que se ele desaba/ Fará o mundo infeliz”.
Em nossa
cidade, a piada nasce das conversas comuns. Numa roda de amigos falava-se sobre
as vantagens da ginástica, de como uma boa corrida matinal ajuda a manter a
saúde. “Isso é bobagem”, observou um dos presentes, “tartaruga não corre e vive
até os trezentos anos”. Durante a ditadura militar, apareceram alguns “arapongas”
da polícia, tentando descobrir se havia subversivos na cidade. Disfarçadamente,
no meio de uns goles de cerveja, perguntaram ao dono do bar se na cidade havia
algum comunista. “Comunista? Que eu saiba não. O que nós temos aqui são muitos
comodistas!”
Antigamente,
não havia em Iguape oficinas especializadas em ataúdes, os quais, por essa
razão, eram confeccionados por marceneiros comuns. Um desses profissionais foi
à casa de uma senhora falecida, tirou as medidas do corpo, preparou e entregou
o ataúde, segundo a encomenda. Entretanto, algumas horas depois, vieram à sua
marcenaria reclamar que o defunto não cabia no caixão. Surpreso, o marceneiro
voltou à casa enlutada para ver o que tinha acontecido. Observando a mulher
estendida na cama, percebeu que ela calçava sapatos com enormes saltos, o que,
naturalmente, a fazia mais comprida que o caixão. O marceneiro encarou os
familiares da falecida e perguntou, com uma ponta de ironia: “Por acaso a
madame vai a alguma festa?”
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