sábado, 18 de maio de 2013

“IGUAPE – CIDADE DO HUMOR FRATERNAL” – LIVRO DE MEMÓRIAS - 2005



O BOM HUMOR FRATERNAL
Para aliviar a “dureza” da vida, em Iguape, temos o vento leste, a cerveja e o bom humor. O vento leste é dom da natureza, a cerveja, embora tenha sua origem no Egito, foi presente dos europeus, mas o tipo especial de bom humor que por aqui viceja, é autóctone. Com relação a isso, nossos conterrâneos seguem à risca o conselho de Oscar Wilde: “A melhor maneira de começar uma amizade é com uma boa gargalhada”. Mas é o mesmo escritor que adverte: “Uma gargalhada também é a melhor maneira de terminar uma amizade”. Afinal, nem tudo é perfeito. Além disso, há quem prefira sacrificar até a amizade para não perder uma boa piada. Mas, insistimos, o humorismo que por aqui viceja é particular e intransferível. Não tem validade universal, não é composto de temas genéricos, que funcionam em qualquer lugar. Ele se sustenta dos elementos da sua própria cultura, ou então reelabora as contribuições alienígenas, acrescentando o tempero local, consistente de gestos ladinos, malabarismos vocais e sintaxe ardilosa. Esse traço particularista torna o humor iguapense uma espécie de código familiar uma linguagem de irmãos, daí o adjetivo fraternal, com que o qualifico.
Mesmo com sua originalidade, é possível entrever o parentesco desse humor com aquele de alguns antigos “mestres do ofício”. Ele lembra um pouco o tom sarcástico de Bocage, o “língua de trapo” dos poetas portugueses, entre outras coisas pelo gostinho de fazer reparos pouco lisonjeiros sobre a aparência das pessoas. Como aquele caso ocorrido num dia de Carnaval. Um grupo de pessoas estava apreciando o desfile dos blocos, em torno da Praça da Basílica, quando passou um sujeito baixinho, com pernas muito curtas. (Alguém havia comentado, pouco antes que, de tanto dançar e pular, muita gente ia “gastar as pernas”) No meio do grupo, uma voz exclamou: “Eh! Aquele dançou ‘pouco’!” Sacada típica de
Bocage, um campeão da sátira, que turbinava suas observações, por meio de epigramas. Foi assim que o mais galhofeiro dos poetas portugueses, referindo-se ao escritor Nicolau Tolentino, que tinha pés enormes, escreveu: “Se o Padre Santo tivesse/ Uns pés dos teus, Nicolau/ Podia mesmo de Roma/ Dar beija-pé em Macau”. E sobre o nariz um tanto exagerado de uma senhora: Nariz, nariz e nariz/ Nariz que nunca se acaba/ Nariz que se ele desaba/ Fará o mundo infeliz”.
        Em nossa cidade, a piada nasce das conversas comuns. Numa roda de amigos falava-se sobre as vantagens da ginástica, de como uma boa corrida matinal ajuda a manter a saúde. “Isso é bobagem”, observou um dos presentes, “tartaruga não corre e vive até os trezentos anos”. Durante a ditadura militar, apareceram alguns “arapongas” da polícia, tentando descobrir se havia subversivos na cidade. Disfarçadamente, no meio de uns goles de cerveja, perguntaram ao dono do bar se na cidade havia algum comunista. “Comunista? Que eu saiba não. O que nós temos aqui são muitos comodistas!”
        Antigamente, não havia em Iguape oficinas especializadas em ataúdes, os quais, por essa razão, eram confeccionados por marceneiros comuns. Um desses profissionais foi à casa de uma senhora falecida, tirou as medidas do corpo, preparou e entregou o ataúde, segundo a encomenda. Entretanto, algumas horas depois, vieram à sua marcenaria reclamar que o defunto não cabia no caixão. Surpreso, o marceneiro voltou à casa enlutada para ver o que tinha acontecido. Observando a mulher estendida na cama, percebeu que ela calçava sapatos com enormes saltos, o que, naturalmente, a fazia mais comprida que o caixão. O marceneiro encarou os familiares da falecida e perguntou, com uma ponta de ironia: “Por acaso a madame vai a alguma festa?”

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